Matéria publicada neste domingo (20) pela Folha de São Paulo informa que a CCR, maior concessionária de estradas do país e quinta do mundo, deu cerca de R$ 5 milhões para o caixa dois da campanha de Geraldo Alckmin (PSDB) em 2010, segundo relatos feitos por representantes da empresa ao Ministério Público de São Paulo.
O dinheiro teria sido entregue ao cunhado de Alckmin, o empresário Adhemar Ribeiro, segundo a narrativa feita à Promotoria, e não consta da prestação de contas.
É a segunda vez que o cunhado é associado a arrecadações ilegais de campanha. A Odebrecht relatou em acordo de delação ter entregue R$ 10,7 milhões a ele, também na campanha de 2010.
A CCR não pode fazer doações eleitorais por ser concessionária de serviços públicos, como estradas, metrô e barcas. Já era esse o entendimento do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) à época da doação, em 2010. Três anos depois esse veto virou lei na minirreforma política.
A empresa tem a concessão de algumas das principais rodovias paulistas, como o complexo Anhanguera-Bandeirantes e trechos da rodovia Castello Branco e da Raposo Tavares.
A concessionária resultou da associação de empresas que já confessaram práticas de corrupção e formação de cartel: a Andrade Gutierrez e a Camargo Corrêa, cada uma com 14,86% das ações.
Nos relatos reunidos pelo promotor José Carlos Blat, a CCR aparece como doadora de R$ 23 milhões para três políticos tucanos de SP entre 2009 e 2012: além de Alckmin, são citados o ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes, e o senador José Serra. Os valores que teriam sido entregues a Serra e Aloysio ainda não foram apurados.
Alckmin e Aloysio negam ter recebido esses valores; Serra não se manifestou.
A cifra de R$ 23 milhões é uma estimativa inicial. O valor exato está sendo investigado por um comitê independente constituído pela CCR.
O ex-diretor da Dersa Paulo Vieira de Souza, apontado pela força-tarefa da Lava Jato em São Paulo como operador do PSDB, é citado como o responsável pela arrecadação para Aloysio. Já o empresário Márcio Fortes é acusado de ter feito a operação para Serra.
A CCR apareceu na Lava Jato em fevereiro deste ano, quando parte da delação do empresário Adir Assad, acusado de lavagem de dinheiro, foi revelada pelo jornal “O Globo”. Num dos depoimentos, ele narrou que suas empresas de fachada e outras verdadeiras haviam recebido R$ 46 milhões da CCR.
Nos relatos apresentados ao Ministério Público, metade desse valor foi distribuído aos três tucanos.
Assad, que já promoveu os show das cantoras Beyoncé e Amy Winehouse (1983-2011) no Brasil e hoje está preso em Curitiba, era especialista em fornecer notas sem prestar qualquer tipo de serviços.
O dinheiro entregue a ele servia para pagar propina ou fazer contribuições eleitorais via caixa dois. Só na Lava Jato ele é acusado de ter lavado R$ 1,2 bilhão.
Há casos, porém, em que as empresas dele prestavam de fato o serviço. Assad tinha firmas que atuavam com terraplenagem, publicidade e até uma equipe de carros de corrida, na categoria “stock car”.
A CCR sempre argumentou que não tinha nada a ver com o passado das duas empreiteiras que criaram a concessionária em 1999. Para frisar a separação, a empresa ingressou num setor da Bolsa que prevê controles internos mais rígidos e um maior grau de transparência, chamado “novo mercado”.
A delação de Assad teve repercussões financeiras. Quando o depoimento dele sobre a CCR tornou-se público, em fevereiro deste ano, as ações da empresa caíram 10,01% num dia, com desvalorização de R$ 4,62 bilhões. O montante se aproxima do valor da principal concorrente da CCR, a Ecorodovias, cujo preço de mercado à época era de R$ 5,47 bilhões.
Foi por conta disso que a empresa criou um comitê para apurar o destino dos R$ 46 milhões pagos a Assad, composto por um ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (Carlos Velloso) e conselheiros da CCR.
A precaução de fazer uma investigação independente tem uma razão: Assad disse ter contato com o presidente da CCR, Renato Valle, e com um ex-diretor da empresa, José Roberto Meirelles.
Segundo Assad, foi Paulo Preto quem o apresentou a eles. Assad disse ter dado dinheiro para o ex-diretor da CCR e Paulo Preto como forma de retribuir os negócios que conquistou.
OUTRO LADO
A assessoria do ex-governador Geraldo Alckmin diz desconhecer a investigação sobre a suposta doação da CCR. Em nota, declara o seguinte:
“1 – A defesa do ex-governador Geraldo Alckmin não tem conhecimento de qualquer denúncia relativa ao fato descrito pelo pedido da reportagem. De qualquer maneira, o fato nunca existiu. É falso.
2- O ex-governador continua disposto a prestar todos os esclarecimentos necessários às autoridades competentes.
3- Estranha-se o fato de essa investigação (caso realmente exista) estar sendo conduzida pelo Ministério Público estadual, e não pelo Ministério Público Eleitoral”.
O ministro Aloysio Nunes (Relações Exteriores) disse que “isso é pura e simplesmente uma mentira”.
O senador José Serra (PSDB-SP) e a defesa do engenheiro Paulo Vieira de Souza não quiseram se pronunciar. A Folha não conseguiu localizar a defesa de Adhemar Ribeiro, cunhado de Alckmin.
A CCR informou por meio de nota que um “comitê independente de alto nível” está apurando as informações sobre os valores repassados a Adir Assad. O comitê é assessorado por escritórios de advocacia nacional e internacional e empresa especializada em investigação.
A empresa afirma que “continua a trabalhar em seu plano de crescimento qualificado, tendo como premissas a disciplina de capital, ética e transparência”.