Se eleito presidente do Brasil, Ciro Gomes (PDT) promete revogar duas medidas de um “governo golpista” (teto de gastos e reforma trabalhista) e “deixar a porta aberta para dialogar com o PSDB”.
E torce para que um eventual segundo turno que conte com sua presença seja contra Jair Bolsonaro (PSL). “A rigor, gostaria muito de enfrentá-lo, me parece o candidato menos difícil de ser derrotado”, afirmou o ex-ministro ao ser sabatinado por Folha, UOL e SBT, em São Paulo, nesta segunda-feira (21). Para Ciro, o adversário é fascista e tem propostas “toscas” para o país.
A aliança com o tucanato pode até ser “completamente disparatosa” do ponto de vista eleitoral, “para ficar numa palavra moderada”, mas é preciso pensar “no dia seguinte às eleições” —e “ter a porta aberta para dialogar” com o PSDB, disse.
Alcançando 9% no último Datafolha em todos os cenários em que Lula (PT) não disputa a sucessão de Michel Temer (MDB), Ciro disse avaliar “o que está em jogo, para quem tem responsabilidade crescente como aquela que estou sentindo crescer sobre meus ombros”: a governabilidade.
Daí a necessidade de pensar no que aconteceria caso ganhasse o pleito, e isso inclui manter pontes com o PSDB, embora o partido, ao seu ver, tenha se aliado ao PMDB para dar um “golpe de Estado” (o impeachment de Dilma Rousseff) “antipobre e antipovo”.
O ex-ministro do governo Lula criticou o presidencialismo de coalizão, que chamou de “uma mentira sofisticada que FHC [PSDB] criou e a qual o PT se submeteu”.
“O modelo de lotear o governo com picaretas e o presidente ficar como testa de ferro nesta ladroeira” é, para o presidenciável, uma fórmula “para o fracasso”.
Seus entrevistadores —os jornalistas Fernando Canzian, da Folha, Diogo Pinheiro, chefe de reportagem do UOL, e Carlos Nascimento, âncora do SBT— apertaram: mas como governar sem força no Congresso?
Ciro disse que a solução é aproveitar os “seis primeiros meses, que dão poderes imperiais ao presidente”, que costuma se eleger com minoria no Parlamento. Priorizaria, nesse período, as reformas fiscal (promete taxar mais os ricos e menos os pobres) e política. “Tenho história, não sou um poeta que chegou agora, como Bolsonaro, e acha que extremismo resolve problema.”
O pedetista afirmou que saberá como “negociar, que não é uma coisa errada”. “Só quem quer ser dono da verdade” acha que não é possível “negociar no atacado”.
Baixar os juros nos bancos, revogar medidas como a reforma trabalhista… Não estaria Ciro “avançando o sinal” e correndo o risco de cometer estelionato eleitoral, fazendo promessas que ele não pode cumprir?
Ele disse recear que “não consiga entregar” tudo o que gostaria, mas se comprometeu a fazer o máximo possível para tirar sua agenda do papel. Sempre negociando. “Não sou candidato a ditador do Brasil, candidato a ditador do Brasil é o Bolsonaro.”
Questionado sobre a reforma da Previdência, cuja votação estagnou no governo Temer, o pedetista propôs primeiro discutir se realmente há um déficit previdenciário.
“É possível afirmar que não tem déficit. Fomos criando puxadinho pra cá, puxadinho pra lá…” Sua tese: se considerarmos as receitas de contribuições (como patronal, Pis/Pasep, Cofins) e de loterias, “a soma disso paga a Previdência e sobra um tiquinho”.
Já outra reforma coqueluche de Temer que vingou, a trabalhista, “é uma selvageria”, afirmou. “Ela permite que um patrão descuidado aloque uma senhora grávida, prenha —que é uma maneira da gente chamar no Nordeste— em ambiente insalubre”. O ponto mais grave, segundo ele, é “o trabalho intermitente”. “No dia em que essa porcaria entregou em vigor”, quase 400 mil postos de trabalho foram destruídos, disse.
O teto de gastos, sancionado em 2017 para impedir o crescimento das despesas acima da inflação pelas próximas duas décadas e equilibrar as contas públicas, foi outro alvo, por possibilitar o congelamento de investimentos em áreas sensíveis como educação. “Não é possível que a gente tenha uma pedra no lugar do coração.”
Vice – Ciro foi questionado sobre três nomes que entraram no bolão de apostas para seu vice: os ex-prefeitos Fernando Haddad (PT), de São Paulo, e Márcio Lacerda (PSB), de Belo Horizonte, além de Josué Alencar (PR), filho do vice de Lula, José Alencar (1931-2011).
Definiu-os como “três amigos queridos”, mas afirmou que era cedo para cravar qualquer nome. Só confirmou uma conversa com Josué.
O vice ideal, para ele, é um homem ou uma mulher do Sudeste, ligado à produção. A “aliança orgânica” que vê para seu governo é com o PCdoB, para formar “um polo de centro-esquerda mais comprometido com conjunto histórico de valores”, com o trabalhismo caro ao seu partido —o PDT de Leonel Brizola.
Após a sabatina, Ciro disse a jornalistas que se vê no segundo turno com o presidenciável do tucanato, Geraldo Alckmin. Essa concorrência seria muito mais desafiadora do que enfrentar Bolsonaro, “um extremista fascistoide”.
Se Haddad substituir Lula na chapa do PT, uma possibilidade aventada dentro do partido, “seria o céu”, disse, antevendo um “debate elegantérrimo” e “exclusivamente focado em ideias”.