Por Davi Lemos (dvlemos@gmail.com)
Religiosos ouvidos pelo NewsBA nesta semana – quando o Supremo Tribunal Federal (STF) debate em audiência pública a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) movida pelo PSOL, que pede a descriminalização do aborto até o terceiro mês de gestação – defendem que o direito à vida deve ser respeitado desde o primeiro momento, que os candidatos a cargos executivos e legislativos devem ser claros quanto à sua posição e que o Poder Judiciário não deve ser o local para a discussão do tema, mas o Parlamento.
“A questão do aborto é parte de uma questão muito mais ampla, que diz respeito à vida. A Igreja defende que a vida dos seres humanos deve estar em primeiro lugar em qualquer discussão e decisão; por isso, a Igreja não pode aceitar o aborto. Quando a humanidade recebeu de Deus os 10 Mandamentos, através de Moisés, aprendeu, com muita clareza que a vida humana deve ser respeitada e protegia de maneira absoluta a partir do momento da concepção”, declarou por meio de nota ao NEWSBA o arcebispo de Salvador e primaz do Brasil, Dom Murilo Krieger.
O prelado ainda deixou claro que “é importante que quem se apresenta para representar o povo por meio do voto expresse com clareza o que pensa a respeito de um tema tão importante como esse da vida. Afinal, além da questão religiosa, o aborto diz respeito a um dos direitos fundamentais do ser humano, base de todos os demais direitos: o direito a existir. É importante que os candidatos a cargos executivos e, particularmente, legislativos, se posicionem, para o eleitor saber em quem votar”, disse o arcebispo católico.
Espíritas – O presidente da Federação Espírita do Estado da Bahia, André Luiz Peixinho, destacou que “todas as discussões que ocorrem sobre o aborto na Câmara ou no Senado têm um embasamento materialista. Em primeiro lugar, é preciso entender que todo ser humano é espírito, encarnado ou desercarnado. Com lei ou sem lei, o aborto é interromper a possibilidade de reencarnação de um espírito”. O líder espírita diz ainda que alegar “direito sobre o corpo” é também mais um argumento baseado nessa visão materialista.
Peixinho diz que muito da discussão aponta para questões materiais. Fala-se PIB, de gastos, dentre outros pontos. “É necessário pensar em pessoas felizes. É muito superficial também o argumento meramente econômico e social”, diz Peixinho, que também é médico. A respeito dos políticos, ele salienta que muitos deixaram de, quando eleitos, observar sua atuação como ofício sagrado. “Sacrifício, ofício sagrado. Seria bom que tivessem esse comprometimento”, aponta o espírita, para quem o narcisismo torna-se uma barreira para que tenhamos esse tipo de representantes abertos a sacrificar-se.
CNBB – A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e também o Regional que une as dioceses da Bahia e de Sergipe emitiram notas nas quais expressam o pensamento contrário da Igreja Católica sobre a descriminalização do aborto.
“O momento exige atenção de todas as pessoas que defendem a vida humana. O poder legislativo precisa posicionar-se inequivocamente, solicitando de modo firme a garantia de suas prerrogativas constitucionais. Todos os debates legislativos precisam ser realizados no parlamento, lugar da consolidação de direitos e espaço em que o próprio povo, através dos seus representantes, outorga leis a si mesmo, assegurando a sua liberdade enquanto nação soberana. Ao poder judiciário cabe fazer-se cumprir as leis, ao poder legislativo, emaná-las”, diz a nota da CNBB.
O presidente da Regional Nordeste 3 da CNBB e bispo de Camaçari, Domn João Carlos Petrini, escreveu ainda, em nota oficial, que “o Brasil enfrenta o grande desafio de mais de sessenta mil homicídios por ano. Caso o Supremo Tribunal Federal, que é um dos órgãos de maior respeitabilidade do País, legitimasse a supressão de um ser humano durante a sua gestação, estaria dando um sinal de que seres humanos podem ser suprimidos quando incomodam. Esta mensagem reforçaria a atitude de adolescentes e jovens que se envolvem em atividades em conflito com a lei e que frequentemente acabam em mortes”. O prelado ainda considerou estranha “uma cultura que valoriza mais a proteção de um filhote de tartaruga e de outros animais do que de um ser humano”.
Evangélicos – O teólogo e pastor da Igreja Batista da Graça, Joás Menezes, ressaltou que, “enquanto teólogo cristão, não dá para segurar nenhuma bandeira que não seja a da defesa da vida”. O pastor, entretanto, ressalta que hoje vivemos uma crise de identidade e formativa. “A maioria das pessoas não consegue debater o tema do aborto da forma como deve ser debatida. A uma questão complexa não pode ser dada uma resposta simples”, apontou. Ao ser perguntado sobre o fato de a questão do aborto ser decidida no Judiciário e não no Parlamento que representa o desejo do povo, Menezes, além de citar uma crise de identidade, também salientou que o respeito à lei só é realizado quando conveniente. “Não se cumpre a lei em benefício do povo”.
O pastor Joás Menezes também salientou que “a vida é um dom de Deus e que deve ser defendida, tanto a do feto quanto a da mãe”.
O NewsBA tentou ouvir representantes de religiões de matriz africana, como o antropólogo e ogã do Terreiro da Casa Branca, Ordep Serra. A reportagem também buscou contato com a Federação Nacional do Culto Afro-brasileiro (Fenacab), mas não obteve retorno até o fechamento da matéria. O NewsBA permanece aberto para a manifestação do pensamento religioso de matriz africana.