O juiz substituto Ricardo Augusto Soares Leite, da 10ª Vara Federal em Brasília, aventou a possibilidade de fuga do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao determinar a apreensão de seu passaporte e proibi-lo de sair do Brasil.
Na decisão, obtida pela Folha, ele manda a Polícia Federal incluir o nome do petista no Sistema de Procurados e Impedidos [de deixar o país], visando ao cumprimento de sua ordem.
O magistrado mencionou declarações do próprio Lula e de seus aliados ao admitir que há chance de ele escapar da execução de sua pena, confirmada pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região).
“Entendo que a própria versão de protestos gerados em seu favor, bem como a própria declaração do acusado, que acusa o Poder Judiciário de golpe em seu desfavor, militam no sentido de que não se esquiva de uma tentativa de fixar domicílio em algum outro país”, escreveu Leite.
“Sua permanência em outro Estado seria, então, somente o exercício de um ‘suposto’ direito de defesa, ante a atuação autoritária dos poderes constituídos. Diante desta postura, entendo necessária uma atuação mais direta e eficaz para coibir este tipo de pretensão”, acrescentou.
A decisão do juiz, de caráter sigiloso, foi tomada na quinta (25), após o pedido ser apresentado pela Procuradoria da República no Distrito Federal. O requerimento foi no âmbito da ação penal na qual Lula é acusado de tráfico de influência e lavagem de dinheiro em suposto esquema para viabilizar a edição de uma medida provisória de interesse de montadoras e a compra, pelo governo de Dilma Rousseff, de caças suecos.
Os procuradores Anselmo Cordeiro Lopes e Hebert Reis Mesquita, autores da petição, sustentam que, com a condenação do ex-presidente em segunda instância, passou a existir desde a quarta (24) “risco concreto” de fuga de Lula, especialmente para países sem tratado de extradição com o Brasil ou que lhe pudessem conceder asilo político.
O documento cita a viagem para Etiópia –país sem acordo com o governo brasileiro–, que havia sido marcada pelo ex-presidente antes do julgamento. O embarque estava previsto para a madrugada desta sexta (26), mas foi desmarcado após a ordem judicial.
A Procuradoria alegou que há elementos suficientes para a prisão preventiva de Lula, mas optou por pedir, inicialmente, apenas medidas alternativas: a entrega do passaporte, com proibição de deixar o Brasil; e a restrição de deixar São Bernardo do Campo sem prévia autorização judicial.
Os procuradores solicitaram que o juiz avaliasse qual seria a melhor medida a tomar. “Caso Vossa Excelência entenda que as medidas cautelares aqui requeridas não são suficientes para a garantia da aplicação da lei penal e a supressão do risco de fuga do réu, registra o MPF (Ministério Público Federal) que as medidas cautelares criminais, inclusive a prisão preventiva, podem ser decretadas de ofício pelo juízo”, argumentaram.
Leite acolheu o pedido parcialmente, sem concordar com os pedidos de prisão e a restrição a viagens nacionais.
O juiz entendeu que os deslocamentos internacionais de Lula merecem “tratamento diferenciado”, pois há no Brasil diversas ações penais em curso contra ele tanto na 10ª Vara da Justiça Federal, em Brasília, quanto na 13ª Vara Federal em Curitiba, comandada pelo juiz Sérgio Moro.
Ele alegou que até as idas a países que mantêm tratado de extradição com o Brasil podem retardar a aplicação da pena fixada pelo TRF-4 e o andamento das ações ainda não julgadas.
Num dos trechos da decisão, o magistrado diz ser de “conhecimento público a divulgação de declarações em que aliados políticos do ex-presidente, visando à politização de processos judiciais, cogitam a solicitação (se necessário) de asilo político em seu favor para países simpatizantes”.
“Pelo menos nos termos da legislação brasileira, o réu não possui direito ao asilo político, e a mera tentativa de obter este acolhimento em outro Estado afrontaria a decisão já enunciada pelo TRF-4 e obstaria o andamento de várias outras em andamento nesta vara e em Curitiba”, afirmou.
Leite determinou que Lula entregasse seu passaporte em 24 horas e a inclusão, pela PF, do nome dele no cadastro de impedidos de deixar o País. Ele ponderou que a medida, por ser cautelar, tem natureza provisória e pode ser alterada, caso a defesa do ex-presidente apresente argumentos e contraindícios à Justiça.