A economia brasileira já começa a sentir os primeiros impactos da Peste Suína Africana (PSA), que desde agosto de 2018 obrigou a China a sacrificar entre 150 e 200 milhões de suínos e pode derrubar em 35% a produção de carne de porco do maior produtor e consumidor mundial dessa proteína. No mês passado, as exportações brasileiras de suínos para o gigante asiático atingiram US$ 35,8 milhões. Foi o maior valor mensal vendido para o país desde o início da série histórica, em 1997. O resultado está 42% acima do obtido com exportações em abril de 2018, aponta o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq).
“A China aumentou muito as importações de suínos e frangos porque a oferta de proteína está menor por causa da peste suína”, afirma a analista do Cepea, Maristela de Melo Martins. Desde fevereiro, a China passou a Arábia Saudita como o maior comprador de frango brasileiro. No mês passado, o país asiático se consolidou como o principal importador de suínos e de frangos, respondendo por 28% e 11,5%, respectivamente, das exportações brasileiras desses produtos.
Ainda não há projeções do impacto no aumento das exportações desses dois produtos, segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), que reúne a cadeia de frangos e suínos. Para Francisco Turra, presidente da entidade, como o frango tem ciclo de produção bem mais curto, ele pode ajudar a suprir mais rapidamente a demanda por proteína. Cada chinês consome 40 quilos de suínos por ano.
As exportações brasileiras de suínos em 2018 somaram 646 mil toneladas e o País foi quarto maior em vendas externas, atrás da União Europeia, EUA e Canadá. Para este ano, a expectativa é que chegue a 900 mil toneladas. Mas há fatores que jogam contra a um aumento repentino da oferta brasileira.
Cria e engorda – O primeiro é próprio ciclo de produção de suínos, que é longo. O tempo entre a gestação de uma matriz e o primeiro filhote pronto para abate é de quase um ano. O segundo fator é que a China só compra produtos de frigoríficos habilitados. Atualmente apenas nove frigoríficos brasileiros são autorizados a exportar para lá.
“Essa é uma grande oportunidade para o Brasil porque a produção chinesa de suínos não deve ser recomposta antes de dois a três anos”, prevê Turra. Ele diz que, com a epidemia de gripe aviária em 2005, o Brasil se transformou no maior exportador de frangos do mundo. Na sua avaliação, pode ser a chance de o País repetir a história com os suínos, pois a produção brasileira tem custos competitivos.
Enquanto a peste suína se alastra pela China e outros países da Ásia, os suinocultores de Santa Catarina, o maior Estado produtor e exportador, aproveitam a alta de preços. Desde fevereiro, a remuneração para os produtores independentes, que não estão ligados a um frigorífico, subiram 33%. Já os produtores integrados, que estão vinculados a uma indústria de carnes, tiveram os preços reajustados em cerca de 20%, afirma o presidente da Associação Catarinense de Produtores de Suínos, Losivanio Luiz de Lorenzi.
“Estamos colhendo os frutos desse problema na China e acredito que, do próximo mês em diante, o preço vai estourar”, afirma Lorenzi. Ele representa 8 mil suinocultores do Estado.
Clair Lusa, dono da granja Suruvi, em Concórdia (SC), que fornece matrizes de suínos para os produtores, diz que nos dois últimos anos chegou a mandar mais da metade das matrizes reprodutoras para abate porque a demanda estava fraca e, desestimulados, suinocultores trabalhavam com animais velhos. “Eles não repunham o plantel”, afirma.
Agora, com a aquecimento das vendas de suínos, a granja suspendeu o abate de matrizes. Nos últimos 60 dias, a procura pelos animais cresceu entre 30% e 40% e o preço das matrizes subiu entre 20% e 30%. “A desgraça de uns é a salvação de outros”, diz Lusa, fazendo referência aos ganhos auferidos pelos produtores neste ano por conta da peste na China.
Inflação – Já há também reflexo na inflação. O preço da carne suína no atacado, que subiu 17,09% este mês, segundo a Fundação Getulio Vargas.
O outro lado da moeda da crise na produção chinesa de suínos é a redução das exportação brasileira da soja em grão, usada na ração dos animais. A Abiove, que reúne a indústria de soja, projeta queda de US$ 2,1 bilhões na receita de exportação do grão para o país este ano.
Cautela – Os produtores paulistas de suínos e frangos continuam cautelosos, apesar do aumento das exportações brasileiras de suínos registrado em abril, em razão da peste suína que atingiu a China e outros países asiáticos. A suinocultura vem de um ano difícil em 2018, com queda das exportações e preços baixos. Os produtores veem a chance de recuperar os prejuízos, mas preferem conter o otimismo. “Temos um cenário que parece animador, mas não dá para comemorar nada ainda”, afirma o suinocultor Antonio Ianni, da Ianni Agropecuária, em Itu, interior de São Paulo.
Segundo Ianni, a peste suína na China, por ora, só está ajudando as grandes empresas que já estariam exportando com preços mais elevados. “Nós, suinocultores independentes, não temos o benefício imediato da maior demanda do setor de carnes mundial, pois não fazemos exportação direta. As grandes empresas que dominam o mercado operam com baixo custo, têm informação privilegiada e ganham dinheiro com a exportação. Vai demorar para os efeitos da peste suína na Ásia chegarem até o suíno na granja.”
Para Ianni, uma possível elevação no preço do suíno vivo seria bem-vinda, pois o suinocultor precisa se recuperar dos prejuízos que sofreu em 2018.
Ianni faz parte da terceira geração de uma família de suinocultores e emprega 140 pessoas. O criador não acredita que a suinocultura brasileira vá crescer muito em função da peste suína na Ásia. “Se eu invisto para aumentar a produção, vou levar dois anos para ter o primeiro porco pronto, pois é um processo que passa por genética, instalações, mão de obra, e o custo é alto. Neste momento, o suinocultor não tem capital para investir.”