Após ficar cerca de dois anos sem inserir novos beneficiários para aquisição de lote em assentamentos rurais, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) anunciou que, a partir de maio, lançará editais para inscrição de novas famílias. O jornal A Tarde informa que, na Bahia, serão destinados 950 lotes que deverão estar ocupados até setembro deste ano, segundo previsão do órgão.
Em todo o país, serão 12 mil lotes em 200 assentamentos. Os trâmites e a operacionalização desse novo processo estão sendo discutidos entre a direção da autarquia e 30 superintendentes regionais em um encontro realizado, nesta quinta-feira (5) e sexta (6), em Salvador, no Hotel Fiesta, para alinhamento estratégico do órgão federal para 2018.
Um assentamento rural, segundo informações do Incra, é formado por um conjunto de unidades agrícolas independentes entre si e instaladas pelo órgão. Cada uma das unidades é chamada de lote e é entregue a uma família sem condições econômicas para adquirir e manter um imóvel.
Os trabalhadores rurais que recebem o lote precisam morar na parcela concedida e explorá-la para seu sustento, utilizando exclusivamente a mão de obra familiar. Eles contam, ainda, com créditos, assistência técnica, infraestrutura e outros benefícios de apoio.
Interrupção – No entanto, há quase dois anos esse processo da reforma agrária estava suspenso. O presidente do Incra, Leonardo Góes, afirmou que a interrupção ocorreu devido a um acórdão publicado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em abril de 2016. No documento, o órgão federal apontava “indícios de irregularidades” em cerca de 600 mil casos.
O número de indícios representava mais da metade do total de famílias assentadas em todo o país – atualmente há 973.610 famílias que vivem em assentamentos e áreas reformadas. Na Bahia, há 48 mil famílias que vivem em 668 projetos de assentamento do Incra.
“São 12 mil lotes já aptos. São áreas que o Incra já tinha adquirido, mas, por conta do acórdão e da ausência de regulamentação, a gente não podia fazer novos assentamentos. A gente criava, mas não podia selecionar novas famílias”, ressaltou o presidente da autarquia.
Góes contou que, entre as irregularidades apontadas, havia casos de funcionários públicos e portadores de mandado eletivo, entre outros. Com o acórdão, houve o bloqueio de inserção de novas famílias no Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA) e de créditos para as que já estavam inseridas.
De abril a outubro de 2016, o Incra preparou um plano de providências que apurava os indícios e atendia às recomendações feitas pelo TCU. “Conseguimos desbloquear quase 80%. O TCU havia feito um cruzamento de dados. Uma coisa é a condição para o assentado ingressar no lote. Tem que ter uma renda inferior a três salários mínimos. Tem que ter uma atividade rural. Mas isso não é uma condição da permanência. O indivíduo pode progredir”, destacou.
Para o restante dos casos, onde os indícios eram mais fortes, foi apresentado um plano de apuração in loco. Já em setembro de 2017, um novo acórdão do TCU tirou o efeito suspensivo sobre a política.
“Ele permitiu ao Incra voltar a fazer seleção de novas famílias. E isso condicionado a uma regra de cadastro mais transparente, participativa, que foi fruto do decreto que regulamentou a lei 13.365”, acrescentou.
Na Bahia, a previsão do presidente do Incra é que, até setembro deste ano, estejam assentadas todas as famílias dos 950 lotes que estão sendo disponibilizados. Deles, 470 são novos de fazendas desapropriadas e compradas e outros 480 são resultados de uma fiscalização feita pelo Incra relacionada a irregularidades.
Segundo Góes, as regiões baianas onde há mais demanda estão localizadas na Chapada Diamantina e no extremo sul. Ele reconhece, no entanto, que o quantitativo disponibilizado não é suficiente para atender à demanda.
“Os movimentos sociais falam em um número muito maior. A gente estima que tenha cerca de 5,6 mil acampados ou trabalhadores assentados esperando por acesso à terra, mas existem outras políticas de acesso, como o crédito fundiário. No país, os movimentos sociais falam em 90 mil pessoas”.
Críticas – O órgão foi alvo de críticas por ter ficado quase dois anos sem dar andamento à política de reforma agrária. “Sofremos críticas, cobranças dos movimentos sociais. Mas, ao mesmo tempo, a compreensão de que não era uma decisão de governo”.
A estimativa dada por Góes diverge dos dados do Movimento Sem-Terra (MST). De acordo com uma das integrantes da direção nacional da entidade, há, na Bahia, 25 mil famílias acampadas somente no MST.
“Inserir novas famílias é fundamental. É o primeiro passo. No entanto, se isso não vier somado com orçamento para desapropriar terras para fazer novos assentamentos, não resolve. É preciso um quantitativo maior de lotes”, ressaltou.